sábado, 5 de janeiro de 2019

História do Giramundo - Estrela da Felicidade




A primeira estrela que vi foi em São Luiz do Paraitinga, SP, um dos últimos baluartes da cultura e folclore brasileiros. Nós (eu e a Ana Maria) a desmontamos para ver como era feita, e depois pesquisamos materiais e técnicas de montagem, e durante este período aconteceu o inesperado: pessoas oriundas de todo o Brasil que passavam por nossa loja reconheciam as estrelas como lembranças de avós e bisavós, mas os nomes que lhes davam eram diferentes conforme a região.

Uma peça de artesanato produzida em todo o Brasil durante pelo menos 200 anos, tecendo estórias e histórias de famílias. O mais bonito é que elas viam as estrelas com um brilho de felicidade, de saudade nos olhos... começamos a recuperar a tecnica, a reproduzir a montagem de varios locais do Brasil, e pretendemos divulgar isso para resgatar este artesanato antigo da época do Imperio. Descobrimos tambem que as moças daquela época, com a mesma tecnica, faziam caixinhas e porta joias.





Eis os nomes que até agora coletamos, a algumas das estórias relacionadas às estrelas: 

Flor de Mandacaru: é assim chamada no Nordeste, onde eles fazem estrelas menores dentro das outras, reproduzindo a geometria da flor do cacto do agreste. Nos contaram que enfeitam varandas das casas e barracas em festas regionais.

   

Giramundo: é o nome mais conhecido, no Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia, têem um pingente que pode ter várias formas e ficam girando ao sabor do vento, de acordo com uma de nossas fontes mostrando às pessoas as várias faces que a vida tem, e que nenhuma delas é permanente. A lenda diz que ela "chama " a sorte ao girar, porisso é pendurada nos batentes de portas, janelas e em varandas.







Carambola: nome dado no interior do Paraná,     
devido à semelhança da estrela com a 
geometria de uma fatia transversal da fruta.

Estrela, Segredo, Cofrinho: nomes conhecidos no estado de São Paulo, devido ao costume da época imperial em que as mães presenteavam a filha que se casava com uma estrela e punham dentro dela algum dinheiro para emergências. Nos relataram que ao redor de 1940-1950 se ensinava nas escolas as meninas a fazer estrelas nas aulas de artes em escolas do interior paulista, com uma abertura, para usar como cofrinho.




Estrela da Felicidade, ou Estrela de San Tiago: nome dado no sul do Brasil e nos pampas em geral, onde a influência da cultura ibérica embutiu um costume místico na feitura das estrelas, que se chama “costurar orações" de proteção ou na intenção de cura, tornando a estrela um amuleto pessoal, lá as estrelas eram feitas por curandeiras.

Espinheiro, agulheiro: nomes dado em Goiás e Mato Grosso, onde são feitas com losangos bem pontudos e estreitos.

Pindaíva ou pindaíba: estrela feita em tons de vermelho escuro, este nome vem da região do pantanal, Goiás, Mato Grosso. É uma fruta vermelha, cheia de pontas, que dá em arvores de mata densa no Brasil central... quando os caboclos não teem mais nada para comer entram na mata para catar pindaívas ( daí surgiu a expressão "está na pindaíba" = não tem nenhum outro recurso)


Tradição oral

Uma variante das estórias ligadas às estrelas veio das fazendas da região serrana do Rio de Janeiro e é particularmente singela,é de que as mães presenteavam as filhas no dia do casamento com uma estrela: durante toda a vida da moça a mãe guardava pedacinhos do tecido usado para confeccionar as roupas dela, lembranças do dia de batismo, aniversários e outras datas, e quando a moça se casava (em geral ainda adolescente) a mãe lhe entregava partes da sua história na forma de uma estrela, que ela iria levar para a casa onde ia começar sua nova história como futura mãe, num ritual de passagem.
Naquela época, muitas vezes a mãe nunca mais via a filha que se casava porque ela podia ir morar em fazendas muito distantes e não tinham formas rápidas de comunicação, e muito raramente as mulheres tinham dinheiro na mão. As mães guardavam então moedas dentro da estrela, antes de fecha-la, para que a moça tivesse dinheiro à mão em caso de emergencias, e por isso as estrelas tambem eram chamadas de "segredo".


Montagem

As estrelas são feitas com papel paraná, 60 losangos revestidos de tecido individualmente e depois costurados uns aos outros, formando 12 flores de formato pentagonal, num trabalho de cerca de 6 horas de costura para uma estrela pequena, para quem já tem bastante prática.





Quem gosta de fazer arte com as mãos sabe que existe um prazer em dar forma à beleza... mas no caso das estrelas é uma coisa intensa, porque a cada corte diferente no tecido elas ganham nova vida, nova forma. É como solidificar sonhos, por ordem na criatividade, organizar a beleza.


gira mundo, e o mundo gira... e a cada volta, se vê outra cor, outra flor, outra vida.












6 comentários:

  1. Muito lindo esse trabalho. Minga mãe faz até hoje. Foi passado por muitas gerações e me encanto com tanta beleza cada vez que ela finaliza seu lindo trabalho.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. você pode perguntar a ela o que ela se lembra da historia destas outras gerações e giramundos? quem fazia, como aprendeu, qual era a aparencia deles? Agradecemos

      Excluir
  2. Beautiful, thank you Paula for the history of this star in Brazil. I could find little information about them when I was researching back in 2011 for my tutorial. It could now be named incorrectly as a Moravian Star which is similar but not exactly the same. I believe they were a popular parlor item during Victorian times, very popular in the past with quilters and now becoming popular again.

    ResponderExcluir
  3. Lindo resgate! Memória afetiva ancestral...!

    ResponderExcluir
  4. Que linda surpresa encontrar essas informações... lembro de ver uma na casa de minha avó, quando era criança... Hoje uma senhora comentou comigo sobre ela e relembrei desse fato, tive vontade de pesquisar e me deparei com essas informações tão cheias de significado e afeto... O próximo passo é fazer a minha... Muito obrigada¨!!

    ResponderExcluir